Na minha casa, sempre fomos muitos. De filhos, meus pais
tiveram três. 1990, 1991 e 1992. Eu, a última e única menina, sem privilégios,
sempre fui tratada por igual – o sonho de muitas feministas e o meu pesadelo. De
primos que se parecem irmãos mais velhos, tínhamos um casal.
Todos
os anos, exatamente na mesma época de nossas férias escolares, meus pais
participavam do ECC - “Encontro de Casais com Cristo”. Eram três dias que
passavam fora, voltando apenas à noite para dormir – para eles, alegria; para nossa
babá, pesadelo; para nós, diversão.
As
coisas mais terríveis nós aprontávamos “coincidentemente” nessa época do ano.
Eram pernas e braços quebrados, queixos cortados e infinitos arranhões. Eu, que
sempre fui impressionantemente fisicamente flexível, me esquivava desses tipos
de lesões. Porém, nunca negava uma boa brincadeira.
Num
desses dias, no quintal da nossa casa grande, com todos os irmãos e primos,
resolvemos brincar com uma velha caixa cheia de brinquedos. Como a infância faz
com gente grande, os brinquedos dos anos que deixávamos pra trás nos acertavam
e deixavam marcas – acompanhadas de sorrisos. Mas, como nem tudo são flores,
nem tudo ali era brinquedo – “se escondam que eu vou jogar”, gritou o primo
mais velho, mas não mais sensato, quando encontrou um pedaço quadrado de
madeira. Eu, apressadamente, me escondi atrás da outra caixa que estava no
final do quintal e esperei.
Porém,
o pedaço do que um dia foi árvore não me esperou. Parecia mágica, ilusão ou
mentira (porque milagre não poderia ser): a madeira, ao ser jogada, fez uma
curva e uma de suas pontas me acertou à cabeça. Desde criança, aparentando ser
forte, sem lágrimas nos olhos, disse “tudo bem” enquanto todos me olhavam com
olhos arregalados e tentavam me fazer crer que dali saía sangue. Ainda
incrédula, passei a mão no lado esquerdo na cabeça, olhei e a vi completamente ensanguentada.
Fez-se, então, o desespero de uma criança no auge dos seus cinco anos. Mais
rápida que ambulância, minha mãe chega em casa e me leva para fechar a cabeça.
Foram precisos três pontos, uma lágrima e um sorvete de baunilha.
De
lá pra cá, em nossas discussões, quando o sangue sobe à cabeça, a lágrima fica
prestes a sair dos olhos e o sorvete fica pra mais tarde, não param de usar o
argumento que tenho a cabeça fechada.
2 comentários:
Deve ter entrado um tantinho de vento antes de fechar!
:)
Gente, que coisa boa de ler.
Bem, ao menos sua cabeça não é fraca - você nunca se cansa de ouvir piadas assim?
E o seu primo era um terroristazinho, ao que me parece.
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